Disponível na Amazon Prime Video, City Hunter: O Caçador de Encrencas adapta o mangá de Tsukasa Hojo.
A Netflix tem investido fortemente nos remakes live-action de animes, e, após o enorme sucesso de One Piece, dificilmente isso vai parar. Uma das próximas empreitadas é uma nova adaptação de City Hunter de Tsukasa Hojo. Só espero que um eventual sucesso não ofusque a primeira tentativa de trazer a obra para o mundo de atores de carne e osso.
Disponível na Amazon Prime Video e com distribuição da Sato Company, City Hunter: O Caçador de Encrencas é, assim como Carruagens de Fogo, um filme do qual muitos lembram de um elemento em particular, mas não de onde este vem. Todo fã de jogos antigos já viu na internet a imagem de Jackie Chan vestido de Chun Li. Há de se entender por que muitos não saberiam qual produção teve o luxo de ter esta cena, pois desde 1973 Chan tem um ritmo de trabalho, digamos, insano, tendo protagonizado, dirigido, produzido e cantado para centenas de filmes.
Na história, Chan interpreta Ryo Saeba, um detetive particular mulherengo o qual está em conflito sobre a atração que sente por sua pupila e parceira Kaori. Sendo contratado para resgatar a filha de um magnata, este, no maior estilo “Sessão da Tarde”, se mete em “altas aventuras com uma galera da pesada”.
Primeiramente, assim como é feito com muitos animes, é preciso ter discernimento sobre certas diferenças culturais para aproveitar City Hunter apropriadamente, senão de início a dinâmica entre Ryo e Kaori vai afastar o espectador desavisado. Para aqueles os quais conseguem divertir-se com as cenas do Mestre Kame em Dragon Ball sem, necessariamente, concordar com as atitudes do personagem, não devem haver problemas.
Assim posto, a produção consegue, pra bem ou pra mal, chamar atenção por sua abordagem. Deixa-se a abordagem aparentemente mais sóbria do anime e abraça-se uma atmosfera extremamente lisérgica.
A partir do momento em que o maior astro da comédia de ação foi chamado, inevitavelmente City Hunter focaria no humor, porém mesmo para alguém que ficou famoso no ocidente graças à trilogia A Hora do Rush, esta adaptação surpreende. Surpreende ainda mais pois aquele foi o mesmo ano em que Chan aventuraria-se em um de seus filmes de ação tonalmente mais sóbrios, o excelente Crime Story.
Em vez de ter sido entregue a diretores mais tradicionalistas do cinema de ação de Hong Kong tais como Lau Kar Leung ou Yuen Woo Ping, os quais usam do humor para complementar a ação, o comando do filme foi dado a Wong Jing, responsável pelos bons A Lenda do Dragão Vermelho e O Culto do Mal.
Quem tiver o prazer de conferir um destes dois (especialmente o segundo), vai perceber que o cineasta gosta de cores vibrantes, movimentos de câmera histriônicos, aleatoriedades quase intergalácticas, ação imprevisível e personagens excêntricos. É o que City Hunter entrega à granel, alternando entre momentos de descontração, ação habitual de Chan e interrupções na narrativa geradas por cenas de festas que só poderiam ter saído dos anos 90 (duvido alguém não cantarolar Gala Gala Happy após a principal delas).
Ao contrário dos filmes considerados ambiciosos do cinema de Hong Kong, o qual esbanja as telas com proporções horizontais extensas (em vez de “Cinemascope” eles orgulhavam-se do seu “Shawscope”, homenageado por Tarantino em Kill Bill), Jing preferia filmar em 1.85:1, proporção de tela que privilegia altura e faz com que os close ups nas reações e rostos de atores fiquem potencialmente mais cômicos.
Ainda que haja questões de ritmo (todo excesso pode acabar cansando, afinal), a produção parece feita sob medida para a era Tiktok, pois a cada instante pode surgir uma nova informação em tela ou um novo desafio insano para o protagonista. Tudo isso, claro, sem perder os arquétipos: O herói, o vilão inescrupuloso, o capanga fortão (o entusiasmo de Gary Daniels como Ken na cena emblemática de homenagem a Street Fighter rivaliza com o Chan Chun Li), a moça a ser resgatada, além de algumas heroínas divertidas também.
Embalado por uma excelente canção tema cantada por Jackie Chan (outra marca registrada das suas produções fora de Hollywood), City Hunter: O Caçador de Encrencas, de 1993, imperfeito como é, equivale a 105 minutos de uma boa e colorida diversão.
City Hunter- Trailer
Mesmo trabalhando na área de educação, estuda e escreve sobre cinema desde os treze anos. Mesmo vendo muita coisa fora de Hollywood, não é hater de blockbusters (nunca deixa de ver um Velozes e Furiosos quando lança). Ama também ler e jogar videogame. Apenas evita comédias românticas e livros de auto ajuda.