Escrito pela excelente Cláudia Lemes e lançado pela Editora Avec, Inferno no Ártico é um livro que prende do início ao fim e mexe com todo nosso conceito de humanidade.
Bárbara Castelo é uma detetive brasileira que se muda para Barrow, uma cidade no Alasca, a fim de fugir de problemas do passado e em busca de respostas para seus medos e anseios (ainda que de forma inconsciente). O lugar, em determinada época do ano, fica em um completo breu. E Bárbara terá que lidar com sua fobia por escuro nessa cidade onde é sempre noite.
A detetive é refém de lembranças do passado que a machucam e tiram seu sono. Lembranças reais que se misturam com sonhos, pesadelos, tudo muito confuso em sua mente. Sofrera muito durante toda sua vida com essas memórias. Estava sofrendo ainda mais após descobrir segredos envolvendo sua finada mãe, seu pai e um padrinho. É interessante entender como tudo isso desencadeou para a sua decisão de se mudar para esse fim de mundo escuro e frio.
Como se não fosse suficiente ter que ser uma detetive novata em uma cidade estrangeira e ter que conviver com alguns policiais machistas e preconceituosos, comentários negativos e depreciativos, tendo constantemente sua capacidade sendo questionada, ela ainda precisa lidar com um parceiro durão e… com o início de uma série de acontecimentos envolvendo crianças, um serial killer, mortes, rituais de magia negra e uma corrida contra o tempo para pará-lo antes que seja tarde demais!
Há, aqui no Inferno no Ártico, uma dedicação incrível da escritora Cláudia Lemes em criar uma história repleta de camadas sobre a vida da jovem detetive, sua família e passado, assim como do seu parceiro, Bruce, como vão criando laços durante toda aquela loucura que está acontecendo naquela cidade que outrora fora tão pacífica e como as coisas, às vezes, não são como achamos que são, nem as pessoas.
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Esse livro é capaz de nos fazer roer todas as unhas, chorar, sentir repulsa, medo, ansiedade e raiva, muita raiva. Por isso, é importante frisar que ele é recomendado para maiores de 18 anos e que contém muitos (muitos mesmo!) elementos que podem dar gatilhos para algumas pessoas.
Cláudia Lemes traz, em Inferno no Ártico, o pior do ser humano. Sua capacidade de ultrapassar todos os limites, de ir além do inaceitável, ela nos mostra toda a sujeira que um indivíduo pode desenvolver (ou já ter) dentro de si. O mal moral que, segundo o filósofo Rousseau, foi criado pela humanidade e que nos faz escravos dele. O mergulho dentro de um mar projetado na cabeça de pessoas incapazes de separar a razão e a obsessão.
Uma obsessão aqui apresentada na forma de um serial killer ligado ao satanismo, decidido a tudo para cumprir os desígnios de seus “superiores”: demônios opressores que ditam ordens em sua cabeça doentia. Levando-o, assim, a cometer os mais terríveis assassinatos como forma de rituais para um apoteótico e derradeiro fim, mesmo sendo sua própria morte consequência disso. Ou seja, um homem no seu estado mais maligno: escravizado, decidido e sem nada a temer.
Inferno no Ártico, contudo, vai além dessa dualidade de bem contra o mal. O ser humano é retratado de forma real, sem amarras ou maquiagens. Há uma reviravolta que nos pega desprevenidos. Encaramos as cenas com assombro, tal qual um tapa na cara dado do mais absoluto nada. É genial e assustador o desenvolvimento de todos os personagens ali. Não há redenção, não há beleza, apenas temos personagens indo ao inferno e voltando (ou não) dele.
No livro há inúmeras referências interessantíssimas como mitologias diversas, elementos culturais tanto brasileiros quanto estadunidenses e até a Sherlock Holmes. Além disso, a autora teve um cuidado digno de muitas palmas ao elaborar todo o contexto, os diálogos, os avisos no início do livro, seu depoimento acerca dos estudos que fizera antes de escrever Inferno no Ártico, etc. Ela realmente mergulhou nessa missão de mostrar a realidade, ainda que dura de conceber, da nossa humanidade. É real, ainda que não queiramos admitir.
Por fim, fica nossa indicação dessa obra realmente assombrosa e apaixonante. Inferno no Ártico merece sua atenção e dedicação. Não irá se arrepender!
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Apaixonada por arte, música, literatura e filosofia. Adora a Disney, Harry Potter e Sherlock, além de ser viciada em memes. Ri de tudo, é meio perdida nas ideias, viajante do tempo nas horas vagas, só anda com fones nos ouvidos e ama tudo que é fofinho, inclusive o editor-chefe desse site.