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Salamandra | Drama modesto acomodado no reino das promessas

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Salamandra é promissor na direção, mas não consegue se aprofundar nas próprias premissas.

Se tem uma temática familiar ao cinema brasileiro é a entrega aos sentimentos carnais tanto enquanto subsistência num mundo opressivo quanto no que se diz respeito à busca por novas perspectivas. Numa cultura tão pautada na fisicalidade e, ao mesmo tempo, recheada de dogmas pudicos, não é de se espantar que seu cinema busque justamente trazer luz à sexualidade enquanto necessidade da mesma forma que Yasujiro Ozu abraçava a tristeza e fazia seus personagens a exprimirem, mesmo tendo tido uma formação adepta do “guarde seus sentimentos pra si”. 

Das aventuras do Macunaíma de Joaquim Pedro de Andrade passando pela homoafetividade de Babenco, a sexualidade nunca vai deixar de orbitar o imaginário do cinema nacional. Isso nos traz a Salamandra, filme do recifense Alex Carvalho o qual passou por festival em 2021 e parou num limbo de distribuição por três anos. 

Na trama, Catherine (Marina Fois) é uma francesa que pousa em Recife para se reconectar com sua irmã (Anna Mouglalis), estabelecida no Brasil, e consigo mesma. Em meio a isso, acaba por conhecer Gil (Maicon Rodrigues), um sujeito carismático com quem acaba se entregando física e romanticamente. A relação destes toma proporções tão intensas quanto perigosas. 

Pôster oficial de Salamandra

Não falta ambição em termos de premissa: duas pessoas separadas pela língua e cultura as quais conectam-se. Há em ambos uma necessidade de fugir de sua realidade, no caso de uma a de boa filha cuja meia-idade chegou após anos de serventia ao pai, e do outro a da miséria financeira e social. Fazer com que ambos acabem se apaixonando mesmo sem que um consiga entender verbalizações de outro é um desafio e tanto para um roteirista e diretor. 

Enquanto diretor, por sinal, Carvalho mostra-se apto: suas tomadas são saudavelmente longas, habitadas devidamente por seus personagens dentro do enquadramento juntamente com o design de produção (com devida atenção pra cada um e um ritmo fluído de entrada e saída de pessoas por cena). A escolha por um aspecto de 1.85:1 permite boa atenção tanto à fisicalidade dos atores (e esta é bastante explorada) quanto às locações e design de produção. Quando as tomadas enquadram os atores em planos médios (corpo inteiro e atenção ao cenário) a produção consegue seu brilho devido ao cuidado do diretor. 

Há deslizes, por exemplo, na cena da balada envolvendo o casal principal: não entendo o uso de lentes curtas (ou seja, foco nos personagens e também na multidão ao redor deste, sem embaçamento) para filmar um espaço tão reduzido, especialmente porque as lentes longas (com embaçamento e foco apenas em um personagem) são bem utilizadas quando fazem-se presentes. 

Os inserts (planos de detalhes de objetos, gestos ou espaços específicos) também não me agradam tanto, especialmente, nas cenas eróticas, drenando a atmosfera quando surgem e gerando estranheza. Por sorte, a prioridade são os planos com expressão tanto no erotismo quanto no mundano, trazendo beleza para ambos.

Marina Fois e Maicon Rodrigues em Salamandra

A deficiência maior de Salamandra é no roteiro. A aproximação de Catherine e Gil é abrupta, sem que conheçamos devidamente nenhum dos dois (apesar de bem filmada pelo diretor, a protagonista é blasé e distante demais, e raríssimas vezes há foco ao segundo), o que torna as decisões impulsivas da primeira apenas absurdas, tais como usar a herança de seu pai num empreendimento de uma pessoa que esta mal conhece. 

Tal falta de aprofundamento gera diálogos os quais apenas verbalizam o óbvio (num deles um “Por que você o trata tão mal?” é respondido com “e como eu deveria tratá-lo?” e em seguida com “…bem?”) e situações enfadonhas em vez de tensas. A espiral destrutiva deste relacionamento, a qual deveria ter o mínimo de investimento de seu público, perde completamente sua força por vermos menos personagens e mais caricaturas de lugares comuns (e tome estereótipos da indolência e situações de desconforto envolvendo Gil das mais batidas). 

Promessas de um grande suspense erótico são feitas, mas o que é entregue é uma obra apenas razoável conduzida por um diretor que tem muito potencial. Apenas resta esperar por tanto talento no visual quanto no situacional e verbal na próxima vez. 

Salamandra é uma coprodução do Canal Brasil e Telecine, e chega aos cinemas dia 27/06 com distribuição da Pandora Filmes.

Salamandra – Trailer

Salamandra – Trailer

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