Rivais, novo filme de Luca Guadagnino, se vende como opção de “entretenimento adulto” e sintetiza consumidor infantilizado
Quando os super-heróis encontram-se em momento de hiato após anos de dominação, há espaço para todo tipo de nova empreitada para os produtores de grandes estúdios descobrirem qual vai ser a nova galinha dos ovos de ouro.
O sucesso de Barbie e Oppenheimer em 2023 mostra-se como terreno fértil para um filme tal como Rivais domine: tendo uma estrela em ascensão encapando o pôster, estilização vazia e conflitos rasos disfarçados de dilemas “adultos” e “sensualidade”, o novo longa de Luca Guadagnino traz o que há de pior em ambos os (bons) filmes citados.
Na história, Tashi (Zendaya) é uma ex-tenista a qual viu-se quando mais jovem como centro de um triângulo amoroso entre Patrick (Josh O’Connor) e Art (Mike Faist) e, no presente, vê-se num casamento insípido com o segundo e reencontrando o primeiro como um jogador intempestivo e em decadência. Com os dois prestes a disputarem uma partida decisiva, Tashi busca ter seus interesses atendidos com a dinâmica dos dois homens tanto enquanto jogadores quanto amantes.
Há algumas coisas as quais são pressupostos de tramas envolvendo triângulos amorosos: ao menos dois dos três indivíduos precisam mostrar-se como seres com os quais queremos ter o mínimo envolvimento nas duas horas de exibição, seja por suas personalidades quanto pelos riscos envolvidos pelas relações. Rivais não apresenta nem uma coisa nem outra: como todo mundo neste universo de Guadagnino se vende como “desconstruidão” e já num cenário de franca decadência, o máximo de risco é apenas a permanência ao status quo estabelecido nos primeiros minutos.
No que tange às personalidades, o resultado é um desastre. Não há nada de errado no que diz respeito às atuações, porém os personagens retratados são seres unidimensionais, estereótipos do jovem adulto modernoso o qual viveu o pior dos anos 2010.
Guadagnino, assim como 90% de Hollywood, retrata a personagem de Zendaya como a “mocinha sarcástica e cheia de atitude” a qual resume sua personalidade a comentários confrontando os personagens masculinos (ainda que, por bem ou mal, Tashi direciona sua vivência e visão de mundo justamente à dinâmica entre os homens e nada mais), os quais são capazes de largar sua dignidade por dez segundos de atenção desta. Enquanto isso, os homens são ainda menos interessantes: frívolos e sem nenhuma inteligência emocional, são dois patetas tão atraentes quanto Debi e Loide.
O roteiro de Justin Kuritzkes (ironicamente marido de Celine Song, do bom Vidas Passadas, o qual mesmo retratando adultos cheios de contradições, sabia como abordá-los e desenvolver suas relações), além de não construir situações interessantes para o trio, nos presenteia com alguns dos diálogos mais risíveis dos últimos tempos: abandonando o subtexto em prol de metáforas vazias, Kuritzkes traz os protagonistas dizendo frases tais como “Tennis é como um relacionamento”, explicando verbalmente o que deveria ser subentendido pelo público e, por consequência, mostrando a visão do roteirista sobre o grau de compreensão deste.
E não é apenas o roteirista que chafurda na obviedade. Se Guadagnino mantém-se invicto enquanto diretor de atores, este fracassa irremediavelmente do ponto de vista estético. Abraçando os planos com duração quase de milésimo de segundo, ambientações mal preenchidas, muitos close ups e “blocking” amador (é o tipo de filme o qual, quando escolhe enfocar mais de dois indivíduos em sua composição, se contenta em colocar a mocinha em uma camada superior e os dois “pretendentes” abaixo, de modo a retratar o tal triângulo), Guadagnino desperdiça os poucos bons momentos de composição ao cortar a cena em dois segundos (tal como um momento no vestiário envolvendo Art e Patrick).
Em contrapartida, este mostra-se um verdadeiro exibicionista quando enquadra o tennis, com alguns planos a-la Zack Snyder (em seus piores momentos) com slow motion exageradíssimo e tomadas subjetivas grudadas na bola os quais vendem-se como energizados sem necessariamente tornar a narrativa engajante.
Expoente perfeito do cinema de adulto para os adultos os quais passaram tempo demais lendo discursos vazios no Instagram e Facebook pra embasar-se no que quer que seja em suas visões de mundo, Rivais é o tipo de filme conformado com a infantilização de seu público. O sucesso deste com a crítica e público prova ser mais fácil incentivar as piores tendências de seu consumidor (e é esta a palavra, não “espectador”) do que investir em personalidades bem delineadas e conflitos palpáveis.
Rivais – Trailer
Mesmo trabalhando na área de educação, estuda e escreve sobre cinema desde os treze anos. Mesmo vendo muita coisa fora de Hollywood, não é hater de blockbusters (nunca deixa de ver um Velozes e Furiosos quando lança). Ama também ler e jogar videogame. Apenas evita comédias românticas e livros de auto ajuda.