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Quando Chega o Outono | Drama francês é um ótimo antídoto a Emilia Perez

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Filme de François Ozon, Quando Chega o Outono, mostra o cinema francês esteticamente firme e dramaticamente sensível.


Um dos elementos da construção de roteiros o qual está em falta nos tempos pós-Syd Field é a junção de surpresa com coerência. É a construção de histórias que contenham diversas reviravoltas e caminhos inesperados os quais, ainda assim, façam sentido dentro do universo e das figuras representadas. 

Em Quando Chega o Outono, François Ozon preocupa-se em estabelecer a conexão da protagonista, Michelle (Hélène Vincent), com o ambiente interiorano habitado por esta. Os dilemas urbanísticos com os quais a idosa terá de lidar sendo antagonizados pelo naturalismo das paisagens nas quais vive despreocupada são uma justificativa perfeita para que sua a paz seja perturbada e, com isso, o público tenha novidades constantes para absorver. 



Na trama, Michelle vive em paz numa vila interiorana, sendo vizinha de sua amiga de longa data, Marie Claude (Josiane Balasko), cujo filho acaba de sair da prisão (Pierre Lotin). Enquanto busca ajudar o rapaz, a protagonista empolga-se para receber seu neto (Garlan Erlos), que pretende passar as férias em sua casa. Em uma visita deste acompanhado de sua mãe, a qual é filha da protagonista, um incidente faz com que os planos sejam mudados, o que leva a uma série de acontecimentos com os quais Michelle terá de lidar, incluindo uma situação de suicídio e revelações do passado sendo divulgadas.

Quando Chega o Outono triunfa em termos de escrita pela paciência com a qual revela os detalhes iniciais da narrativa. Cada lacuna parece ter o formato perfeito para ser preenchido, seja com descobertas acerca de onde Michelle conseguiu uma fonte de renda razoável ou com a imprevisibilidade de um homem aparentemente bem intencionado, sobre o qual podemos apenas supor por que passou anos na prisão. 

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Trata-se de um mundo no qual diversas pessoas guardam uma série de ressentimentos e preconceitos embasados em tabus e, nisto, há o moralismo sexual, a precarização capitalista, o linchamento popular, entre outros. 

É um filme feito pensando num mundo do cancelamento, o qual remete bastante ao também ótimo Anatomia de uma Queda, onde também havia muita sugestão e pouca mastigação. Assim como naquele filme, as atuações fazem toda a diferença, com duas surpresas: Erlos, o qual imbui empatia e dor internalizada a Lucas, o neto de Michelle, e Hélène Vincent, uma atriz cujo olhar e voz evocam a sabedoria e a serenidade de décadas de sofrimento e aprendizados. 



Mas, acima de tudo, o ator principal deste filme é o diretor: dando importância para cada enquadramento, Ozon realça desde os mais prosaicos tais como o plano-contraplano a partir dos ombros dos atores para conversas e marcando cada acontecimento com a grandiosidade devida (praticamente todos ocorrem com planos abertos e evocativos em ambientes multicoloridos, explorando o frame de 1.85:1 com a altura devida). Cada situação nova ganha gravidade e efeito dramático, e a duração dos planos é proporcional à importância que cada um deve ter, jamais cortando de forma abrupta. 

Concluindo-se em um breve e contundente epílogo, o qual trata de amarrar quaisquer pontas soltas, deixando um bom material para reflexão (como todo ótimo roteiro tem que fazer), Quando Chega o Outono é um belíssimo filme que poderia ter ganhado prioridade na temporada de premiações recente. Porém, um certo filme com tanto tato quanto um elefante manco passou na frente. 

Quando Chega o Outono chega aos cinemas em 27 de março, distribuído nacionalmente pela Pandora Filmes.

Trailer de Quando Chega o Outono:


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