O Sabor da Vida

O Sabor da Vida | Romance consueto compensa com direção vistosa

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Candidato da França ao Oscar deste último ano, O Sabor da Vida vai agradar aos espectadores mais visuais.

Um dos maiores debates sobre esta temporada de premiações foi a decisão da França em não candidatar o excelente “Anatomia de uma Queda” a Filme Internacional, e sim “O Sabor da Vida” (título digno de campanhas publicitárias cafonas para “A Paixão de Dodin Bouffant” no francês). Entre os indignados vinha o argumento de que houve retaliação estatal ao posicionamento da diretora do filme estrelado por Sandra Huller, algo que não posso confirmar (e tampouco me interesso em pesquisar).

Entendo que é natural que dificilmente a Academia indicaria a esta categoria um filme francês em que mais de 50% dos diálogos são em inglês e, com isso, só resta aceitar que este romance estrelado por Juliette Binoche e Benoît Magimel foi o escolhido pelo país, não tendo tido força para conseguir a indicação. Claro, isso não diz algo necessariamente algo negativo: dos dez indicados a melhor filme, apenas um eu incluiria entre os melhores de 2023, então vejamos como O Sabor da Vida se sai pelo que é.

A história não poderia ser mais simples: na França do século XIX, num contexto bucólico sem forcas ou guilhotinas, uma cozinheira profissional e um chef passam seus dias preparando refeições elaboradas para os amigos deste último, no caso os fidalgos e ilustres daquela região. Enquanto não fazem isso, alimentam uma relação de amantes em que o homem insiste em pedi-la em casamento, com pouco sucesso.



A relação destes dois com a ambientação é o norte da narrativa e trata-se de uma produção com pouquíssimo a oferecer em subtexto. Se não falam sobre a beleza local ou, no maior estilo Ana Maria Braga, descrevem a “rica textura de alimento blá blá blá”, os personagens limitam-se a expressar-se por referências as quais servem menos para trazer riqueza às opiniões e pontos de vistas e mais para ressaltar obviedades.

Enquanto produções tais como o espanhol As Bestas ou o japonês Dias Perfeitos (o qual merecidamente conseguiu sua indicação) trazem figuras humildes expressando pontos de vistas únicos sobre o mundo em que vivem, O Sabor da Vida faz o contrário em seu roteiro, trazendo um romance situado na “alta sociedade” dos mais triviais e cidadãos bidimensionais que expressam com palavras enfeitadas visões das mais enfadonhas. 

Embora extremamente frágil em seu roteiro, o filme de Trần Anh Hùng investe fortemente na estética e, neste sentido, se sai acima da média. Gravado em 1.85:1, a produção investe fortemente em tomadas internas com movimento fluído de câmera (de modo a fazer a cozinha e a sala de cear personagens dentro da trama) e em estáticas em externas. A escolha do diretor é de um aspecto o qual preenche o quadro enquanto permite liberdade de linguagem corporal de seus atores. Com isso há muito dinamismo de posicionamento e de uso de cenários, seja em tomadas com luz solar quanto aquelas as quais usam a escuridão. 



O trabalho conjunto de posicionamento e movimentação do diretor aliado às cores da fotografia de Jonathan Ricquebourg fazem a produção ter vida além do roteiro, felizmente. Os atores, mesmo presos a figuras caricatas, fazem sua parte. Como valorizo estética e direção, O Sabor da Vida me agradou, porém num contexto em que outros cineastas conseguiram extrair beleza do inesperado (e nisso destaca-se novamente o brasileiro Saudosa Maloca), o trabalho de Hùng apenas filma beleza em sua superficialidade.

O Sabor da Vida – Trailer


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