Filme italiano, O Penitente, mostra o desespero de um roteirista longe de seu tempo de glória.
Um dos melhores vídeos do canal Moviewise aponta sobre a possibilidade de se detectar imediatamente um excelente diretor, apenas olhando para a imagem e composição e, com isso, detectando elementos os quais demonstram disciplina e bom uso do quadro, além do tempo apropriado para situações ocorrerem.
O que Luca Barbareschi faz em seu O Penitente é o extremo oposto das demonstrações de virtude apresentadas no vídeo do canal, com uma direção e um roteiro dos mais preguiçosos e excessiva preocupação com relevância temática a qual não se sustenta seja em suas escolhas de caminhos quanto nas execuções.
O roteiro, inacreditavelmente assinado pelo outrora grande David Mamet (baseado em sua peça homônima), tem como protagonista um psiquiatra (também interpretado por Barbareschi), que cai em desgraça após seu ex-paciente ter matado uma série de pessoas. Enquanto sua esposa (Catherine McCormack, dublada em italiano de forma mais hilária do que aquelas para o mandarim e cantonês feitas para produções da Golden Harvest) busca incentivá-lo a não deixar-se levar pela imprensa, a qual associa o surto violento à identidade LGBTQ+ do paciente, o protagonista se vê confrontado pelos ataques midiáticos, pela religião e pela justiça.
Primeiro roteiro de Mamet após passar 15 anos falando idiotices sobre política e prestando apoio ao reacionarismo, este mostra que não foram apenas seus posicionamentos que foram ao fundo do poço. Se Hannibal, de 2001, parecia ser uma exceção numa carreira cheia de pontos de interesse, em 2024, com O Penitente, as cenas ridiculamente prolongadas, o excesso de verbalização de sentimentos e situações (as quais nunca são de fato mostradas, apenas expostas no falatório) e as “reviravoltas” gratuitas parecem ser a tônica da escrita do sujeito.
Se citei o vídeo do Moviewise acima, é porque a primeira cena do longa já estabelece o quão ridículo este será: contando com uma discussão escandalosa entre os dois personagens da sinopse, ambos mostram-se impetuosos e arrogantes, os dois são acompanhados pela direção de Barbareschi (que aparentemente escolheu o frame de 2.39:1 porém em sua distribuição internacional a produção está em 1.66:1) em ambientes iluminados em tons brancos típicos de novela da Globo, com pouca interação relevante com o ambiente e agindo como adolescentes proibidos de usar o celular.
Além de uma demonstração de como não enquadrar seu elenco mesmo usando quadros abertos, a cena inicial ainda assim mostra-se como o exemplo menos deselegante da direção de Barbareschi. Após isso há uma sucessão de close ups extremos, ambientes azulados e altos contrastes do design de produção e fotografia.
O tom escandaloso e caricato do texto de Mamet, o qual tenta contestar os aparentes males da cultura da saúde mental e o “terror da identidade de gênero” contamina as conversas e faz com que todo mundo pareça estar brigando a nível pessoal, independentemente de qual a esfera envolvida em conflito.
O Penitente trata-se do cinema partidário do nível mais rasteiro possível, o qual quer sempre explicar suas próprias virtudes, enquanto usa e abusa dos clichês do cinema italiano (especialmente nas demonstrações de indignação e tristeza dos personagens, os quais fazem Giulietta Masina parecer Judi Dench em comedimento).
Não há apelo visual, não há diálogos interessantes, apenas um respiro final patético de um roteirista decadente escondendo-se por trás de outra nacionalidade. Sempre defendo que não é necessário aceitar o ponto de vista de um filme para aproveitá-lo, porém O Penitente parece referir-se em seu título não ao seu protagonista e, sim, ao coitado que aceita assistir a essa coisa.
Sinopse de O Penitente:
Nova York. A carreira e a vida pessoal de um psiquiatra começam a desmoronar após ele se recusar a testemunhar a favor de um ex-paciente violento e instável, responsável pela morte de várias pessoas. A identidade LGBT do jovem paciente, a fé judaica do médico, a fome de notícias da imprensa e o julgamento severo da lei, agravados por um erro de impressão no editorial de um jornal, desencadeiam uma reação em cadeia explosiva. A perseguição midiática e a pressão do sistema judiciário se somam ao dilema moral do psiquiatra, que se apoia no juramento de Hipócrates para se defender das acusações, pressões e traições de todos os lados em busca da verdade. Quem é, afinal, o verdadeiro monstro? O rapaz? O médico? A imprensa? A justiça? Quem pode realmente ser considerado inocente?
19ª Edição do Festival de Cinema Italiano no Brasil:
O evento, que já faz parte do calendário brasileiro há 19 anos, começa no dia 7 de novembro. O Festival, mais uma vez, estará presente em todo o Brasil, e dessa vez levará filmes para mais de 70 cidades de todas as regiões do país. Além disso, todos os longas estarão disponíveis em formato online e poderão ser vistos no site do Festival.
Mais informações em: https://festivalcinemaitaliano.com/
Mesmo trabalhando na área de educação, estuda e escreve sobre cinema desde os treze anos. Mesmo vendo muita coisa fora de Hollywood, não é hater de blockbusters (nunca deixa de ver um Velozes e Furiosos quando lança). Ama também ler e jogar videogame. Apenas evita comédias românticas e livros de auto ajuda.