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Milton Bituca Nascimento | Documentário honesto no que se propõe

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Filme Milton Bituca Nascimento vem para exaltar um artista em sua turnê de legado.


Defendo constantemente a tese de que é preciso analisar e apreciar filmes pelo que eles são e não pelo que queríamos que estes fossem. Não sou o espectador mais assíduo de documentários por priorizar o escapismo do ficcional quando aprecio arte, porém valorizo o trabalho dos documentaristas, sendo um gênero o qual pode misturar informação e beleza de várias formas. É um caso longe de se enquadrar em qualquer definição Scorsesiana de “ser cinema”, ainda porque o diretor de Taxi Driver tem uma carreira gigantesca enquanto documentarista. 

Roger Ebert, o crítico de cinema mais notório da história, costumava dizer “Um homem vai ao cinema. Um crítico tem que ser honesto o bastante para admitir que é este homem”. Enquanto um homem que raramente visita documentários na tela grande, vejo diversas razões para ver Milton Bituca Nascimento. Este projeto de Flavia Moraes se propõe a acompanhar a turnê de despedida do cantor título e, com isso, pincelar sobre alguns dos desafios da trajetória deste e, acima de tudo, exaltar a criatividade e espírito libertador representado por este.

Milton e diretora Flavia Moraes, por Marcos Hermes.

Tratam-se de duas horas nas quais acompanhamos breves dramatizações, as quais fazem ótimo uso do onírico para representar o processo criativo e de descoberta de Milton Nascimento e, com isso, aproveitar também o quadro longo de 2.35:1, o qual funciona especialmente quando faz uma analogia visual do eco obtido pelo som emitido numa imensa caverna, que serviu de fio de partida para suas realizações. 

Com isso, diversos dos quadros obtidos pela diretora são grandiosos. Volta e meia encontram espaço para serem intimistas (a câmera do lado de fora da porta onde Milton conversa sobre certas passagens e ideias). A diretora também mostra habilidade para criar expectativas rumo às apresentações derradeiras do cantor em sua turnê, culminando em sequências multicoloridas, com quadros grandiosos e extensos, além de muita música de qualidade (justificando a empolgação dos entrevistados). 

A despedida de uma lenda

Como costuma ser em documentários, a edição tem papel forte de várias formas: conduz a “narrativa”, une e alterna entre os segmentos de depoimento, discursos internos e exposição e fica responsável por buscar soluções as quais possam manter o dinamismo das imagens numa era em que o Podcast é a referência para conversas informativas. 

Se já podemos ficar aliviados com a competência do processo de edição, a presença de figuras fortes para documentar a trajetória do retratado concretiza a produção enquanto material cinematográfico chamativo. Existe uma diversidade de depoentes, desde cantores adjacentes ao gênero e país (Gilberto Gil, Djavan, Caetano Veloso, Chico Buarque) até os inusitados, os quais demonstram imenso prazer em exaltar o cantor (Spike Lee destaca-se). Algumas das escolhas parecem questionáveis do ponto de vista de coesão temática (Djamila Ribeiro ganha muito mais destaque do que Djavan, com um discurso o qual inevitavelmente flerta com o panfletário), porém não atrapalham a produção de forma severa. Como apreciador de música nacional, fiquei bastante empolgado com a extensão do segmento sobre Clube da Esquina. 

Milton e Spike Lee

Pude notar entre outros espectadores da produção um incômodo, afirmando que, ao evitar falar sobre imperfeições ou problemas enfrentados pelo protagonista, “Milton Bituca Nascimento” parece mais um especial de fim de ano do que um documentário. Devo discordar, pois desde o início a narração grandiosa de Fernanda Montenegro deixa claro que a produção pretende exaltar os feitos alcançados durante o trajeto colossal percorrido pelo personagem-título muito mais do que discutir os tropeços e as dores do caminho.

Milton Bituca Nascimento é um documentário dos mais honestos e satisfatórios no que se propõe a dispor e não deve desagradar aos interessados. 

Sinopse:


Milton Bituca Nascimento é o documentário que parte da turnê de despedida de Milton Nascimento, um dos maiores artistas brasileiros de todos os tempos, para entender a complexidade simples de sua obra e da alma brasileira. Com distribuição da Gullane+, longa estreia em 20 de março.


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