memorias-de-um-corpo-ardente-topico-42-capa

Memórias de um Corpo Ardente | Filme não cai nas armadilhas de formato duvidoso

Compartilhe:

Memórias de um Corpo Ardente, filme espanhol exibido no Festival Filmes Incríveis, acerta ao priorizar boa história.


Em meu texto sobre A Flor do Buriti, falei sobre como o gênero “semidocumentário” não costuma me agradar. Trata-se de uma opinião e o trabalho de um crítico envolve abraçar até os gêneros distantes de seus gostos. Isso nos traz a “Memórias de um Corpo Ardente”, um semidocumentário o qual mesmo abraçando elementos distantes das minhas preferências, distingue-se por sua condução.

Em termos de história, é tudo muito simples: uma atriz (e outras em cenas de “flashback”) encena as memórias e desejos internalizados por mulheres acima dos sessenta anos. A ideia é representar a vida destas como uma história só, através de suas narrações e com isso mostrar os desafios vividos por estas em períodos nos quais sexualidade feminina era tratada como um tabu, além de o marido servir basicamente como seu proprietário.

A narração verbaliza praticamente tudo que vemos em cena, algo aceitável na mídia documental. A sorte é que a diretora Antonella Sudasassi consegue transformar até o mais mundano dos acontecimentos em algo visualmente interessante. Filmado em 2.35:1, mesmo sendo quase inteiro situado em uma casa, Memórias de um Corpo Ardente consegue preencher o quadro horizontalmente com elementos de cenário relevantes, posicionamento inteligente da atriz principal e composições as quais aproveitam dimensões da ambientação. 

A abordagem contemplativa permite progressão visível através de mudanças da dinâmica da personagem central com seu ambiente, permitindo que as explosões de frustração vindas de traumas e sentimentos internalizados sejam notáveis e catárticas. As atuações, todas com personagens creditados com substantivos (“A Mulher”, “O pai”) são extremamente naturais, seja nos momentos de leveza ou nos de maior peso. 

Memórias de um Corpo Ardente está na programação do Festival Filmes Incríveis.

O trabalho de edição também alia-se de forma inteligente com a direção, pois há uma série de transições inteligentes as quais aproveitam o cenário principal, sempre permitindo a movimentação fluída dos atores e da câmera pelos tempos narrativos e situações. 

Memórias de um Corpo Ardente trata temas relevantes com a seriedade necessária e, mesmo contando com a narração constante, não parece forçar expressões de consternação de seu público. A direção, mesmo adotando um formato o qual considero duvidoso, preocupa-se muito mais com o ato de contar uma boa história do que explorar emoções de seu público. Trata-se, portanto, de um filme simples o qual, ao acertar no mais importante, consegue atrair até mesmo os menos interessados por seu formato. 

Sinopse de Memórias de um Corpo Ardente:


Duas sexagenárias, Ana e Patrícia, e uma septuagenária, Mayela, cresceram numa época em que a sexualidade não era discutida ou expressa livremente por ser considerada um tabu. Aprenderam a ser mulheres a partir das normas silenciosas e das exigências ocultas da sua sociedade. Agora eles têm a coragem de compartilhar abertamente suas experiências. Suas histórias são contadas de forma poética: enquanto narram suas vidas em off, outra mulher entra em cena encarnando suas memórias, segredos e desejos.

O filme conta com Antonella Sudasassi na direção e com o elenco formado por Liliana Biamonte, Sol Carballo e Paulina Bernini Viquez e foi selecionado como a entrada da Costa Rica para o Oscar 2024 e vencedor do Prêmio do Público na mostra Panorama do Festival de Berlim, também este ano.

Sobre o Festival Filmes Incríveis:


A partir de 1º de Agosto o REAG Belas Artes (SP) será o centro de uma volta ao mundo em produções cinematográficas de 20 países que formam a seleção do Festival Filmes Incríveis do Belas Artes Grupo.

Todos são inéditos no circuito brasileiro, e apresentam as novas obras de cineastas renomados, como o brasileiro Karim Aïnouz e o cambojano Rithy Pan, além de um longa do polonês Krzysztof Kieslowski.

O festival acontece até 14 de agosto e é patrocinado pelo Desenvolve São Paulo, Secretaria do Estado de São Paulo e o Ministério da Cultura. 


Compartilhe:

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *