Eternos

Eternos | Qual o limite da fé?

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Eternos: filme de Chloé Zhao tenta ser um ponto fora da curva no padrão Marvel, mas falha ao não explorar sua própria proposta. 

Fé é crer firmemente em algo, sem ter qualquer evidência tangível do objeto da crença. Essa parece ser a discussão que Eternos tenta traçar, qual o limite da fé e quando perdemos nossa racionalidade ao acreditar em algo intangível cegamente. Os Eternos vêm como divindades do céu nos primórdios da humanidade para salvar a raça humana dos Deviantes. Para os humanos, eles são deuses e, para eles, Arishem funciona como um deus, é nele que depositam sua fé até então inabalável.

O que nos leva a questionar nossas crenças? Estamos dispostos a tudo por uma força maior? Eternos acertadamente aborda esse tema ao longo de toda a história, cada personagem mudando a forma com que encara seu propósito na vida com o passar dos séculos, tal qual a humanidade passou a questionar seus deuses com o aumento de sua consciência, com o crescimento e evolução da ciência e o desvendar dos mistérios do mundo. Aqui, além de uma figura divina, temos a figura pastoral de Ajak (Salma Hayek) que conduz seu rebanho através da palavra e da promessa de um retorno ao lar, ao seu paraíso. Muito mais que um rebanho, os Eternos são uma família e como toda família tem suas diferenças o que leva a uma separação  inevitável. 

A partir do momento em que se espalham pelo mundo o contato com a humanidade aumenta, eles passam a questionar, crescer e evoluir. Cada personagem lida com um arquétipo diferente, entre eles há aqueles que seguem inabaláveis, os que aceitam uma nova realidade, os que questionam o livre arbítrio, os que preferem se manter neutros, os que adotam um novo deus e por ele está disposto a tudo, “o amor”, dentre diversas outras nuances. 

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A todo momento o filme permeia a possibilidade dos Eternos de interferir ou não nos conflitos, quantos massacres eles poderiam ter impedido ao longo da humanidade? Aliás, livre arbítrio é um tema constante que leva um deles, Druig (Barry Keoghan), a se isolar do mundo, por não aguentar o peso de ter o poder para interferir e mesmo assim ter que se ausentar. 

Nesse ponto se iniciam os problemas do novo capítulo do MCU, apesar de todos os personagens apresentarem nuances interessantes para serem exploradas, em nenhum momento conseguem passar da superfície, alguns são mais prejudicados do que outros, como o próprio Druig, mas podemos citar outros exemplos, como Makkari (Lauren Ridloff) que é surda e Phastos (Brian Tyree Henry). Esse sendo o primeiro personagem abertamente LGBTQAP+ entre os heróis da Marvel, temos sua família em tela, filho, marido e um beijo, uma cena rápida, uma migalha para o ano em que estamos, mas um passo importante dentro da maior franquia atual do cinema.

Os demais Eternos, apesar de mais explorados, não chegam a ser tão interessantes, com exceção de Kingo (Kumail Nanjiani), o alívio cômico do filme que diferentemente de diversos outros filmes, funciona muito bem. Sprite (Lia McHugh), parece estar ali com apenas um único propósito no filme, assim como Gilgamesh (Ma Dong-seak).  

Infelizmente o núcleo central com Ikaris (Richard Madden) e Sersi (Gemma Chan) não funciona tão bem. Eles são o tema central ao lado de Thena (Angelina Jolie), mas a falta de química e veracidade entre eles atrapalha na construção do plot principal. A relação entre eles, a história que construíram juntos e seu passado devem ser o fio condutor do filme, mas a partir do momento que isso não funciona o filme perde em emoção e se encaminha para um terceiro ato problemático. Não ajuda o fato do vilão Kro ser completamente esquecível, apesar de seu discurso quanto aos Deviantes, ele está ali apenas para gerar cenas de ação genéricas e preencher um tempo que poderia ter sido melhor utilizado. 

Eternos é um filme com diversidade de personagens e recheado de temas interessantes e complexos, mas parece ter medo de mergulhar na própria proposta, ele não passa da superfície em muitos momentos, mas quando consegue fazer isso entrega o seu melhor, ele é um respiro, um alívio em meio a tanto mais do mesmo.


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