Incompetência de Agente das Sombras (filme de ação reaça) traz um possível novo sentido à vida de um crítico frustrado.
Em quase vinte anos de carreira escrevendo sobre filmes e estudando a sétima arte, cheguei a certos métodos e critérios. Muitos anos experimentando e vendo absolutamente todo tipo de produção, da mais obviamente rasteira às mais caprichosas deram espaço a períodos prolongados de descobertas vendo filmes de alguns dos maiores mestres.
Logo, cheguei a uma maneira de determinar o que me vale a pena assistir. Pra começar, precisa ser algo que desperte interesse imediato. A parcialidade e simpatia que sinto por alguns cineastas já me fidelizou (M. Night Shyamalan pode dirigir remake de Cinderela Baiana e pode ter certeza que irei assistir num lugar com tela grande), porém sempre vale a pena dar a chance aos novos talentos.
Caso eu receba uma recomendação sincera de algo cujo tema possa me despertar interesse, permito uma chance: Não gostei do trailer de Lady Bird, porém as recomendações e certos temas me despertaram interesse num dos melhores filmes de 2017.
Anos e anos acompanhando os grandes mestres do cinema do mundo inteiro. Como a metáfora diz, pude estar “sobre os ombros de gigantes”. O grande problema é que isso leva a um defeito incontornável: a habilidade de detectar desleixo em poucos quadros e minutos de duração.
O que então poderia me levar a aguentar algo como Agente das Sombras até o final? Seria possível descobrir o sentido da vida vendo um filme cujo uso inteligente do design de produção é nulo? Em que quase nunca os atores parecem estar dividindo o mesmo espaço? Onde os cortes de edição são mais rápidos do que desespero batendo durante o horário de pico na estação da Sé às 18 horas?
Haveria uma razão pela qual alguém poderia sentir-se atraído a um projeto o qual esbalda-se nos maiores clichês do gênero (mais um da série “profissional da lei distanciado do seio familiar prestes a se aposentar”) sem trazer nenhum tipo de uso imaginativo destes? Fórmulas podem ser boas. Se não o fossem então como explicar que três dos cinco melhores filmes estrelados por Jackie Chan têm “Mestre” no título? Mas o toque do caixa quando fala mais alto do que o do artista acaba resultando num ruído mais desesperador do que sertanejo universitário no último volume.
Por fim, não necessariamente vou descartar um filme por abraçar um espectro político do qual eu discordo. Até os deuses do Olimpo estão de prova de que sou grande fã de Clint Eastwood e apreciador das produções dirigidas por Mel Gibson. Já que mencionei Jackie Chan, A Hora do Acerto é um baita filme mesmo tendo como mensagem “Esses jovens de hoje que só jogam videogame precisam respeitar a santidade da polícia”.
Todavia, quando um filme esteticamente e narrativamente inepto, o qual sente a necessidade constante de verbalizar tudo, tem como mocinha indefesa uma jornalista negra a qual é caracterizada como o que os alucinados de rede social chamariam de “lacradora”, precisa sempre ser salva e protegida, em contraste com seu protetor, o senhor de meia idade, intocável e irretocável, um cidadão a dirigir o melhor carro e ter as melhores soluções para todos os problemas, fica bem difícil de praticar a tolerância política.
Talvez valha a pena exercer o direito de refletir até sobre as maiores atrocidades pelas quais somos acometidos. Exercícios de paciência também são exercícios, e podem demandar mais esforço e resiliência do que subir uma ladeira numa Caloi enferrujada. Só espero que o próximo filme de Liam Neeson seja apenas uma duna macia para se transitar em vez de uma muralha.
Agente das Sombras – Trailer
Mesmo trabalhando na área de educação, estuda e escreve sobre cinema desde os treze anos. Mesmo vendo muita coisa fora de Hollywood, não é hater de blockbusters (nunca deixa de ver um Velozes e Furiosos quando lança). Ama também ler e jogar videogame. Apenas evita comédias românticas e livros de auto ajuda.
Li todo seu texto por curiosidade de saber se eu estava certa em ter detestado o filme! Ufa,eu estava certa!!!