The Midnight Gospel

The Midnight Gospel | Trilogia de um

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Criada por Pendleton Ward, o mesmo de Hora de Aventura, e pelo comediante Duncan Trussell, The Midnight Gospel está disponível na Netflix.

Em The Midnight Gospel, acompanhamos a jornada de Clancy, um rapaz que vive na Faixa, um local distorcido que fica entre dimensões e tem suas próprias leis da física. Clancy vive em seu trailer, vestindo apenas chapéu e toalha, seu objetivo é ficar famoso e viver do seu SpaceCast, um podcast transmitido por todo o universo e, para isso, ele conta com um simulador de realidades que o leva para diversos mundos através de um avatar e o faz ter contato com diversas situações, histórias e experiências.

Mas, o que faz com que The Midnight Gospel não seja apenas mais uma animação overrated e acabe chamando tanta atenção? Bom, TMG (pra facilitar) conta com um traço característico de Hora de Aventura, vocabulário bem casual (palavrões, gírias e questionamentos aleatórios) e uma narrativa, que pode ser dividida em três níveis: um auditivo, que seria o próprio podcast; um visual, que é a aventura que ocorre durante a entrevista; e um nível maior, por assim dizer, que ocorre fora do simulador e no qual acompanhamos a vida do nosso protagonista.

A narrativa auditiva conta com debates de natureza política, filosófica, religiosa, teológica e existencial, sobre a vida e principalmente a morte. Todos os debates são levados com um tom sério, de opiniões baseadas em dados e experiências de profissionais, mas também preenchidos de experiências pessoais que nos permitem conhecer melhor e entender o nosso protagonista. Podemos considerar que essa narrativa tem um peso indireto sobre a narrativa maior.

A narrativa visual é (na minha perspectiva) a mais interessante. Por se tratar de uma simulação, Clancy aparece em diversos avatares diferentes, que exercem um papel de existência passiva na aventura. Ele está ali, é possível interagir com ele, mas sua interação com a situação é secundária e sua presença passa quase despercebida.

Enquanto o entrevistado é o protagonista tanto do podcast quanto da aventura, Clancy toma uma postura mais passiva, como um escudeiro que cobre a retaguarda ou que precisa ser salvo. Apesar de parecer um show de aleatoriedades, a narrativa visual também contém a sua dose de crítica, o primeiro episódio, um apocalipse zumbi, simboliza a destruição do estado e a paranoia constante da população com a pandemia e conspirações do governo (além da uma leve referência à Madrugada dos Mortos). No segundo episódio podemos identificar a crítica ao sistema econômico, ao consumismo e a desigualdade social. Posteriormente teremos críticas às religiões, sistemas penitenciários e por aí vai, mas não daremos spoilers.

A narrativa maior é onde acompanhamos a vida de Clancy, podemos ver os troféus (sapatos) colecionados de suas aventuras e o peso dos debates sobre ele. A narrativa maior é tudo que acontece na Faixa, onde temos o cotidiano de Clancy, a edição do podcast e sua interação com seus familiares e vizinhos. Podemos ver como sua personalidade vai sendo influenciada por suas aventuras, a reflexão gerada pelas mesmas e como tudo se entrelaça, como em uma teia de aranha. Quem acompanhou Hora de Aventura deve ter percebido como o show começa com episódios aparentemente desconexos e logo vão se interligando e formando uma linha narrativa, podemos esperar o mesmo de TMG? Acredito que sim.

Assim como grande parte das animações direcionadas a adultos, The Midnight Gospel pode ser assistido de várias formas. Por um lado, possui um simbolismo muito forte, no qual suas alegorias requerem certa sensibilidade e conhecimento para serem totalmente entendidas, tornando necessário assistir outras vezes em momentos diferentes, para assim desenvolver diferentes reflexões. Por outro lado, nada nos impede de assisti-lo como um passatempo, um show em que para apreciar o nonsense, a aleatoriedade e alguns palavrões, afinal, ninguém é obrigado a ser Cult.


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